Por anos, incontáveis de workshop de reciclagem ensinaram aos brasileiros, criancinhas, adultos, idosos, donas de casa, comunidades carentes e povos indígenas, a maravilha de “reciclar” garrafas PET. As garrafas de PET usadas passam então a servirem para várias coisas. Vasos para plantas, brinquedos, bijuterias, árvores de Natal, móveis ou qualquer coisa inimaginável. Paralelo a isso, foi criado um mercado de roupas com malha PET, identificada como ecologicamente correta. Camisas caríssimas porque salvam o Planeta, diz a propaganda.
Uma mentira que só virou verdade nesta sociedade do século 21, porque foram repetidas milhares vezes. A realidade é essa: O uso de uma garrafa PET velha no seu quintal ou em forma de roupa, ou como um “telhado verde”, não é reciclagem e nem preserva o meio ambiente. Reciclagem é quando uma garrafa PET velha vira uma garrafa PET nova, como é feito com as garrafas de vidro. Só assim o uso da matéria prima, o petróleo, e o gasto de energia estarão reduzidos. Mas o que acontece com a PET, na realidade, é o contrário disso. A garrafa PET na prática mundial não vira uma nova garrafa PET. A garrafa velha vira um outro produto, um processo que internacionalmente recebeu o nome “Downcycling”.
Ao contrário do vidro, a PET não pode ser reutilizada na linha de produção original e o seu processo de reciclagem de verdade é ainda caro e complicado. Por isso a indústria de embalagens prefere utilizar matéria prima para seus produtos e inventou a propaganda da PET-Recicling.
Novos mercados para o lixo de PET foram criados que de fato estão estimulando a produção de novas garrafas PET à base da matéria prima petróleo. Por exemplo, o novo mercado de Eco-Camisas, Eco-Bolsas ou Eco-mochilas de PET, precisa de produção de novas garrafas de PET à base da matéria prima. E isto é um ato contra a sustentabilidade, contra o meu ambiente e contra a nossa própria saúde.
Pior: ao contrário das fadas da propaganda da indústria química, a produção de PET nem é fácil ou limpa. Além do uso de petróleo, também várias substâncias tóxicas são necessárias ou são criadas durante o processo. Por exemplo, a indústria está usando trióxido de antimônio no processo de fazer PET. Mas antimônio é um metal pesado venenoso e pode criar câncer. “A Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC) classifica o trióxido de antimônio no Grupo 2B – possivelmente carcinogênico para o ser humano.”
A substância orgânica Bisfenol-A (BPA) é um outro grande vilão na produção de garrafas de plástico e de outras embalagens. Esta substância de fórmula (CH3)2C(C6H4OH)2 é um estrogênio sintético e pode causar câncer e infertilidade. Já foi provado há anos que o Bisfenol-A pode contaminar os líquidos dentro das garrafas de PET ou de outros plásticos.
Quem compra garrafas de PET e as usam no seu quintal como um viveiro ou quem cria um sofá de PET ou bijuterias, também está responsável pela continuidade do uso do petróleo, pela mineração de antimônio e seus efeitos danificadores e pela contaminação do meio ambiente com substâncias tóxicas e cancerígenas.
O mundo não precisa de garrafas, camisas ou viveiros de PET. Vidro é o melhor material para guardar qualquer bebida, inclusive a água. As garrafas de vidro podem ser reutilizadas centenas de vezes. E o material de vidro pode ser reciclado sem fim. O próprio vidro é a melhor matéria prima para fazer vidro.
“Ar condicionado em minutos: faça o seu com garrafa PET”, “Luminária feita com garrafa PET“, “Tomateiro em garrafa PET“, “Coruja de garrafa PET”, “Palco de garrafas PET”, “Como fazer uma horta com garrafa PET”, “Prancha feita de garrafa PET”,… Milhares de websites e jornais com a bandeira “verde” ensinam milhares de possibilidades de reutilizar garrafas de PET. Mas o pior uso de uma garrafa de PET é reutilizá-la como garrafa para água ou outras bebidas. E o pior do pior é usá-la para bebidas alcoólicas, como a nossa tradicional cachaça. Garrafas de PET são em geral produzidas para serem utilizadas uma única vez, são garrafas descartáveis. Por isto o material só é aprovado para ser usado, no máximo, uma vez para bebida de consumo humano. Já o primeiro uso mostra um risco de contaminação com elementos químicos da produção de PET, um risco que as autoridades de vigilância sanitária e da saúde do país ainda acham mínimo ou desprezível.
Mas cada reutilização da garrafa com uma nova bebida aumenta o risco. Substâncias tóxicas como o plastificante no PET podem entrar no líquido e em seguida podem causar doenças, como o câncer. Especialmente quando o líquido está com um grau de álcool acelerado, como na cachaça, com uma média de 40 graus de álcool, o risco é ainda mais alto. Porque o álcool superior à 20% é mais agressivo e pode absorver os pequenos elementos tóxicos do plástico, como a substância orgânica Bisfenol-A (BPA), entre outras.
Para pessoas que gostam de uma boa cachaça de alambique de Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo ou do Nordeste, reutilizar garrafas de PET é uma maldição. Muitos pequenos produtores deixaram de colocar a pinga num garrafão de vidro em troca da mais barata e mais leve garrafa de plástico. Mas além de criar um risco à saúde do consumidor – beba com moderação! – o PET não é um material inerte como o vidro. PET comum tem um risco alto de alterar o sabor da bebida e na verdade estraga a cachaça.
Espero que este artigo chegue as mãos dos produtores de cachaça, para salvar este patrimônio brasileiro e seus consumidores.
Norbert Suchanek, Correspondente e Jornalista de Ciência e Ecologia, é colaborador internacional do EcoDebate.